Com o aumento no número de estudantes com deficiências matriculados, o acesso não é o que mais preocupa. Agora, as unidades devem manter a qualidade do ensino para promover a inclusão – de fato
A inclusão escolar não se encerra na matrícula. Isso deve estar muito claro entre professores, alunos e gestores. Para que a escola possa ser de todos, a atenção precisa se expandir para além do acesso. Esse é o desafio e, talvez, o caminho definidor entre uma sociedade que simplesmente integra e aquela que inclui. A educação ajuda a promover a equidade entre os alunos, mas é apenas um dos protagonistas no processo de inclusão. Esse olhar deve alcançar outros grupos para que o objetivo de conviver com os diferentes se consolide.
Isso demanda tempo e cuidado. A própria escola precisa se aperfeiçoar. Na opinião de Rebeca Otero, coordenadora de Educação da Organização para a Educação, a Ciência e a Cultura das Nações Unidas (Unesco) no Brasil, o País tem conseguido universalizar o acesso à escola. Isso reforça seu caráter inclusivo, mas é preciso fazer mais, de acordo com ela. Agora, o desafio é trazer qualidade de ensino para todos os alunos, o que diz respeito também aos estudantes com deficiência, transtornos globais de desenvolvimento e altas habilidades/superdotação.
“Esse problema da qualidade impede, por exemplo, que se universalize no Ensino Médio. Os alunos (com deficiência) não chegam lá ou, se chegam, é no nível não condizente com a realidade”, pondera a coordenadora. Esse contexto pode causar o que se chama de exclusão intraescolar. Significa dizer que o aluno nesse perfil tem acesso à escola, mas não está aprendendo como deveria. E as razões são inúmeras, desde a baixa formação de professores até a estrutura que não respeita as especificidades de cada estudante.
Rebeca Otero defende que a verdadeira inclusão só ocorre quando a escola tem esse cuidado. “Eu posso ter uma escola que abriu as portas para todos, mas que não está ainda preparada para isso”, demarca.
Para mudar
Entre as soluções possíveis para mudar esse quadro, está o processo de revisão das práticas escolares. Isso passa também pelo processo de acessibilidade, que, apesar de algumas tentativas, ainda não está concluído em muitas unidades brasileiras. Para Carla Mauch, coordenadora da ONG Mais Diferenças, esse processo deve chegar não só à estrutura arquitetônica, mas também a livros didáticos, comunicação escolar e currículo.
“É necessário pensar em práticas pedagógicas inclusivas. A gente vê um discurso de compreensão, mas, quando vamos ver o dia a dia, percebemos que a escola ainda acaba discriminando, segregando”, considera.
Com o aluno já matriculado, a escola deve olhar para frente. E nisso cabe, inclusive, a reformulação de práticas muito consolidadas. “A seriação, o sistema avaliativo, as cobranças curriculares, a quantidade de alunos por turma e o material didático utilizado podem ser complicadores no exercício da inclusão”, considera Juliana Santana, professora da Universidade Estadual do Ceará (Uece) e mestre em Educação Inclusiva.
Ela sugere que se repense essa estrutura com o objetivo de levar uma educação inclusiva. “É, de fato, desafiador, praticar o respeito às diferenças num contexto de homogeneização, classificação e competição, onde, por vezes, apenas os ‘melhores’ gozam do reconhecimento e das conquistas de promoção”, completa.