Educação para todos


Quando a escola reúne diferenças

Rômulo Costa / romulocosta@opovo.com.br

Mais do que agregar conhecimento, a escola tem a função de reunir ideias, visões de mundo e todas as formas de ser gente. Na sala de aula, os alunos têm a chance de aprender o conteúdo formal, mas também de exercitar algo muito próprio da vida em sociedade: a convivência com o diferente. Pensar em um ambiente escolar que separa estudantes é, de algum modo, contradizer o que ele guarda de mais rico. Foi com esse pensamento que a proposta de escola inclusiva atravessou pelo menos 20 anos de cobrança até se sedimentar em garantias legais.

Até então, a única possibilidade de crianças e adolescentes com deficiência frequentarem as salas de aula era separados em classes especiais ou em instituições especializadas em alunos com esse perfil. Quando as políticas de igualdade começaram a ganhar força, esse pensamento começou a mudar.

A proposta principal foi que todos pudessem usufruir do mesmo espaço escolar e promover a convivência. Começou daí a visão de que a escola pode, sim, incluir todos, sem distinção. A pesquisadora Maria Teresa Mantoan, da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), lembra que essa lógica rompe com uma mentalidade praticada por muitos anos.

Para ela, que estuda a inclusão no ambiente escolar desde 1992, o ponto principal é entender que a educação é “um direito indiscriminado a todos”. E pondera: “No entanto, a nossa educação sempre foi para alguns, embora seja um direito garantido constitucionalmente”.

Para entender como funciona a inclusão no ambiente escolar, Maria Teresa propõe olharmos para a educação que praticamos até aqui. Segundo ela, é preciso refletir sobre a chamada “educação especial”, que separava o ensino para pessoas com deficiência. Essa modalidade tinha como objetivo “substituir o ensino regular para pessoas com deficiência”, explica.

A inclusão contraria essa ideia. “A educação, para ser inclusiva, precisa ter um caráter suplementar e não substitutivo”. Isso quer dizer que o ideal é que os alunos com deficiência possam estar junto aos demais, nas mesmas salas e sendo convidados a aprender os mesmos conteúdos. “A escola inclui quando apoia esse aluno a eliminar barreiras. Isso acontece quando ele, com independência e autonomia, pode frequentar a escola comum”, define Maria Teresa.

Nesse caminho, não é só o aluno com deficiência que deve ser integrado. Estudantes com transtornos globais do desenvolvimento e altas habilidades/superdotação também devem partilhar do mesmo ambiente escolar.

Avanços e desafios

O direito de frequentar a escola comum é um dos avanços obtidos pelas pessoas com deficiência, de acordo com Carla Mauch, coordenadora da ONG Mais Diferenças, que atua na formação de professores para atuar em unidades inclusivas. Em pouco mais de 10 anos, houve uma série de garantias que permitem, pelo menos na lei, a igualdade de acesso a todos.

Uma das vantagens, segundo ela, foi colocar essa discussão em pauta, o que não era tão simples no passado. A gestora cita como conquistas o acesso à matrícula e os dados consolidados sobre esse público na escola. Mas não esquece que há muito avanço por vir.

“Trabalho com a pauta da deficiência há mais de 30 anos. Perto do que tínhamos, tivemos um avanço enorme. No entanto, a dívida histórica é maior”, analisa. Entre os desafios, estão a melhor formação de professores para tratar o tema e a permanência do aluno com deficiência na escola. “Isso é uma mudança complexa. É preciso mudar o olhar, valorizar a diferença”, demarca.

Para ela, a escola ainda tem a tendência de homogeneizar os estudantes. Isso não é um pensamento inclusivo, critica Carla Mauch. “Ainda existe a ideia de competição entre alunos, para saber qual é o melhor. O que a gente propõe é uma mudança radical nessa visão”.

Maria Teresa Mantoan concorda. Segundo a pesquisadora, o desafio maior é de humanizar a escola. “Elas precisam trabalhar a partir da capacidade de cada um dos alunos, e não baseadas em uma média. Isso segrega”, alerta. A professora entende que esse talvez seja a principal lição da educação inclusiva para ofertar a professores, alunos e gestores.

 

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